O leite materno provoca cáries nos bebês?
Resumo das evidências clínicas e científicas sobre a cariogenicidade do leite materno, com dicas e orientações para correta alimentação infantil.
- A cariogenicidade é a propriedade ou capacidade de gerar cáries. Existe um entendimento, por parte dos pais e parcela de profissionais da saúde, de que o leite materno seria uma fonte deste problema. Será mesmo? Revisamos o que a literatura científica mais recente tem a dizer sobre o assunto.
Já há algumas décadas – e especialmente ao longo dos últimos 10 anos -, estudos e evidências clínicas solidificam a posição da amamentação como medida de promoção de saúde e prevenção de doenças. Tanto para lactentes quanto para lactantes, somamos dados a cada ano à lista dos diversos benefícios à saúde que a amamentação traz. Hoje, o ato de amamentar faz parte, inclusive, da Política Nacional de Saúde [1].
- Amamentação em livre demanda – isto é, deve ser oferecida tantas vezes quanto a criança quiser, dia e noite (enquanto for exclusivo);
- Aleitamento materno exclusivo por seis meses;
- Amamentação natural desde a 1ª hora de vida até 2 anos ou mais de vida.
No texto a seguir, discutimos sobre benefícios da amamentação, qual a sua influência no desenvolvimento da criança, como ela se relaciona à saúde bucal dos pequenos e quais são as orientações corretas sobre alimentação infantil.
BENEFÍCIOS DO ALEITAMENTO MATERNO
No aleitamento natural, a sucção que o bebê realiza na mama irá possibilitar o adequado desenvolvimento do sistema estomatognático, favorecendo a maturação normal de todo o complexo craniofacial [3] . Da mesma forma, há o desenvolvimento da cavidade oral, resultado do exercício que a criança faz para retirar o leite das mamas [4].
O aleitamento natural previne, com qualidade e eficiência, as alterações das funções orais, por meio do estabelecimento correto das estruturas duras e moles, propiciando uma tonicidade adequada de toda musculatura do aparelho estomatognático [6]. Possibilita uma adequada respiração com padrão nasal, além da nutrição e dos aspectos emocionais, correta postura da língua e perfeito vedamento labial [7].
A maturidade neural, a evolução e a adequação das funções orais são funções vitais e fisiológicas que dependem de exercícios oriundos da amamentação natural. Por meio delas, a criança alcançará mais que a sobrevivência, alcançará também uma melhor qualidade de vida [7,8].
Para o binômio mãe–bebê, o aleitamento materno configura-se como oportunidade de interação, contribuindo para o estabelecimento de vínculos afetivos que resultam em maior segurança para a mãe e promoção do desenvolvimento afetivo-emocional e social da criança [5].
AFINAL, O LEITE MATERNO CAUSA CÁRIES?
Apesar de todos os benefícios do leite materno, tem- se observado na literatura a relação deste com o aparecimento de cárie na primeira infância. Todavia, muitos estudos defendem, por outro lado, a sua não cariogenicidade.
Provavelmente, o resultado negativo seja reflexo da higiene bucal inadequada após a alimentação das crianças, bem como da falta de controle na introdução de alimentos ou de bebidas açucaradas [10,11]. No ano 2000, a Academia Americana de Odontopediatria (AAPD) manifestou a existência de maior risco de ocorrência de cárie na infância em crianças alimentadas de forma associada ao peito e à mamadeira. A alimentação prolongada e repetitiva sem o acompanhamento de medidas de higienização bucal apropriadas está associada à ocorrência de cárie na dentição decídua [12].
A introdução de líquidos e de outros alimentos antes dos seis meses de idade não somente é desnecessária como pode aumentar o risco da diminuição da produção de leite materno, além de aumentar o risco de infecções [13]. A alimentação complementar deve ser introduzida de forma organizada, estimulando a criança ao consumo de alimentos saudáveis, a exemplo de verduras, legumes e frutas.
Também é importante regularizar os horários de alimentação, ajustando a frequência de consumo alimentar e evitando alimentos açucarados.
GUIA ALIMENTAR PARA MENORES DE 2 ANOS
A esse respeito, o Ministério da Saúde elaborou um guia alimentar para crianças menores de 2 anos de idade, com dez recomendações para uma alimentação saudável: [14]
Passo 1 | Dar somente leite materno até os seis meses, sem oferecer água, chás ou qualquer outro alimento. |
Passo 2 | Ao completar 6 meses, introduzir de forma lenta e gradual outros alimentos, mantendo o leite materno até os dois anos de idade |
Passo 3 | Ao completar seis meses, dar alimentos complementares (cereais, tubérculos, carnes, leguminosas, frutas e legumes) três vezes ao dia, se a criança estiver em aleitamento materno. |
Passo 4 | A alimentação complementar deve ser oferecida de acordo com os horários das refeições da família, em intervalos regulares e de forma a respeitar o apetite da criança. |
Passo 5 | A alimentação complementar deve ser espessa desde o início e oferecida em colher, iniciar com consistência pastosa (papas/purês) e gradativamente, aumentar a consistência até chegar a alimentação da família. |
Passo 6 | Oferecer a criança diferentes alimentos ao dia. Um a alimentação variada e uma alimentação colorida. |
Passo 7 | Estimular o consumo diário de frutas, legumes e verduras nas refeições |
Passo 8 | Evitar açúcar, café, enlatados, frituras, refrigerantes, balas, salgadinhos e outras guloseimas nos primeiros anos de vida. Usar sal com moderação. |
Passo 9 | Cuidar da higiene do preparo e manuseio dos alimentos, garantir o seu armazenamento e conservação adequados. |
Passo 10 | Estimular a criança doente e convalescente a se alimentar, oferecendo sua alimentação habitual e seus alimentos preferidos, respeitando a sua aceitação. |
Observando todas essas recomendações, percebe-se o quanto se busca uma alimentação saudável para as crianças pequenas; em uma fase mais avançada, entretanto, o contato com o açúcar será inevitável. A simples proibição do consumo do açúcar não é realista e, mais importante do que tentar eliminá-lo, é ensinar a criança a seguir um padrão de consumo racional.
EM QUAIS CENÁRIOS O ALEITAMENTO É RELACIONADO ÀS CÁRIES?
A doença cárie está fortemente ligada aos hábitos e práticas alimentares da família. Em revisões sistemáticas da literatura, a maioria dos autores argumenta que a cárie se encontra associada ao aleitamento materno quando o padrão de consumo apresenta determinadas características como…
- livre demanda,
- frequência elevada de mamadas ao dia,
- longa duração das mamadas
- e, principalmente, mamadas noturnas frequentes, levando ao acúmulo de leite sobre os dentes, o que, associado à redução de fluxo salivar e à ausência de limpeza dos dentes, poderia favorecer o aparecimento de lesões [15,16].
Outro fator de risco apontado na literatura é a introdução de produtos contendo sacarose junto ao aleitamento materno, ou a introdução de substitutos lácteos que apresentam em sua composição a sacarose. Dessa forma, a lactose presente no leite materno seria potencializada pela presença da sacarose na dieta do lactante [17,18].
COMO REALIZAR A ESCOVAÇÃO DOS DENTES DAS CRIANÇAS
O importante é ressaltar que a escovação dos dentes deve ser feita desde o aparecimento do primeiro dente na cavidade oral do bebê, pelo menos duas vezes ao dia, sempre realizada por um responsável (ou sob supervisão deste) e utilizando um creme dental com no mínimo 1000 ppm de flúor.
A quantidade de creme dentário a ser utilizada nas escovações é preconizada como: [19,20]
- Para crianças de até dois anos, recomenda-se a quantidade equivalente ao tamanho de um arroz cru:
- Para crianças acima de dois anos, a quantidade deve ser aumentada gradativamente, até o tamanho de um grão de ervilha.
De acordo com a literatura científica, não existem evidencias que associem o aleitamento materno à Cárie Precoce da Infância, principalmente quando for fonte exclusiva de alimentação da criança. Por esse motivo e por todos os benefícios que o aleitamento materno oferece, é fundamental que os profissionais de saúde que atendem gestantes, puérperas e bebês estejam atentos, a fim de realizar o aconselhamento sobre a importância do aleitamento materno, a introdução da alimentação saudável e da higiene bucal, permitindo que as mamães e os bebês desfrutem dos inúmeros benefícios da amamentação deste ato nobre e saudável que é amamentar [21].
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
- Brasil. Ministério da Saúde. Secretaria de Atenção à Saúde. Departamento de Ações Programáticas e Estratégicas. II Pesquisa de Prevalência de Aleitamento Materno nas Capitais Brasileiras e Distrito Federal / Ministério da Saúde, Secretaria de Atenção à Saúde, Departamento de Ações Programáticas e Estratégicas. – Brasília: Editora do Ministério da Saúde, 2009.108p.:il. Acessado em 20/04/2011: http://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/pesquisa_prevalen cia_aleitamento_materno.pdf
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