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Taxa de Infusão de Fluidos em Cetoacidose Diabética em Pediatria: o que há de novo?

Estudo recente analisa correlação entre diferentes taxas de infusão de fluidos e ocorrência de lesões cerebrais. Acompanhe os resultados e nossa discussão.

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No mês passado, publicamos um artigo explicando os pormenores da Cetoacidose Diabética (CAD). Dentre as recomendações, uma das mais importantes se trata da ressuscitação fluídica. Quanto a esse ponto, as recomendações de todas as principais publicações são as mesmas: a ressuscitação deve ser feita com pequenos volumes de cristaloides administrados por longos intervalos de tempo.

No entanto, em junho deste ano, um artigo publicado no New England Journal of Medicine (NEMJ) analisou o efeito de diferentes taxas de infusão de fluidos em crianças e seu efeito na ocorrência de lesões cerebrais. Discutimos, a seguir, a relevância da pesquisa e suas principais conclusões.

Cetoacidose Diabética: detalhamentos avançados para tratamento

 

CETOACIDOSE DIABÉTICA: CORRELAÇÃO COM LESÕES CEREBRAIS

Os autores do estudo referem que lesões cerebrais clinicamente aparentes ocorrem em 0,5% a 0,9% dos pacientes com CAD, manifestando-se como declínio repentino do estado neurológico e sendo associadas a um aumento nos índices de morbimortalidade dessa doença.

Em alguns casos, essas alterações neurológicas súbitas podem deixar sequelas após a recuperação da CAD, como déficits de memória, atenção e QI, bem como mudanças na microestrutura cerebral observáveis em microscopia eletrônica.

O ESTUDO

  • Clinical Trial of Fluid Infusion Rates for Pediatric Diabetic Ketoacidosis
  • Nathan Kuppermann, M.D., M.P.H., Simona Ghetti, Ph.D., Jeff E. Schunk, M.D., Michael J. Stoner, M.D., Arleta Rewers, M.D., Ph.D et al
  • N Engl J Med 2018; 378:2275-2287
    DOI: 10.1056/NEJMoa1716816

As teorias classicamente mais aceitas de lesão cerebral ligada à CAD sugerem que a administração rápida de fluidos reduz a osmolalidade sérica e, consequentemente, provocam edema cerebral — o que faz com que, até hoje, a maioria dos consensos advogue a reidratação lenta desses pacientes.

No entanto, estudos de coorte retrospectiva dos últimos anos não têm mostrado essa associação, insinuando que a lesão cerebral pode ser causada, na verdade, por anormalidades na perfusão cerebral e na inflamação que ocorre no tecido cerebral durante a CAD. 

 

MÉTODOS DO ESTUDO

Foi feito um ensaio controlado, randomizado e multicêntrico em 13 diferentes unidades de atendimento pediátrico dos EUA, conduzido entre fevereiro de 2011 e setembro de 2016. O trabalho avaliou os efeitos da taxa de infusão de fluidos e da concentração de cloreto de sódio nesses fluidos sobre os desfechos neurológicos de pacientes com quadro de CAD.

Nele, foram incluídos 1.389 episódios de CAD em 1.255 crianças de 0 a 18 anos, divididas em quatro grupos de tratamento: um de infusão rápida de solução de cloreto de sódio a 0,45%, um de infusão lenta de solução de cloreto de sódio a 0,45%, um de infusão rápida de solução de cloreto de sódio a 0,9% e um de infusão lenta de solução de sódio a 0,9%.

O artigo explica os regimes de tratamento em uma tabela, que traduzimos a seguir:

 

Os autores esclarecem que os bôlus iniciais de fluidos foram descontados do volume total do déficit estimado calculado para os pacientes, e que esses bôlus poderiam ser repetidos conforme a avaliação do médico assistente para restauração da perfusão periférica e estabilização hemodinâmica. Não esclarecem, porém, se o fizeram em todos os grupos (já que naqueles de administração lenta é dito que não receberam bôlus adicionais), quantas vezes poderiam receber (apenas mais uma vez, totalizando 20 mL/kg?) e em que velocidade o receberam (bôlus rápido? Ao longo de 1 h, como protocolado pela maioria das instituições?).

A insulinoterapia se iniciou logo após a fase de bôlus inicial e não diferiu entre os grupos. Foi dada insulina na taxa de 0,1 U/kg/h e solução glicosada para manter a glicemia entre 100 e 200 mg/dL.

O principal resultado buscado foi uma deterioração do estado neurológico, definido como dois escores consecutivos na Escala de Coma de Glasgow (ou Glasgow Coma Scale — GCS) <14 em qualquer momento nas primeiras 24 h de tratamento.

Outros resultados estudados incluíram avaliação da memória de curto prazo durante o tratamento, lesão cerebral clinicamente aparente (definido como deterioração neurológica levando a início de terapia hiperosmolar, intubação endotraqueal ou morte) durante o tratamento da CAD e avaliação da memória de curto prazo, da memória contextual e do teste de QI 2 a 6 meses após o episódio de CAD.

É importante observar que crianças com GCS ≤11 foram excluídas do estudo, pois a gravidade do quadro impediu que os médicos assistentes randomizassem esses pacientes nos diferentes grupos.

 

RESUMO DOS RESULTADOS

No final, a GCS foi <14 em 48 episódios (3,5%) do total de CAD estudadas, houve 12 episódios de lesões cerebrais aparentes (0,9%), ocorrendo uma única morte entre esses 12 casos. Não foram observadas diferenças significativas entre os grupos de tratamento em relação à porcentagem de episódios de GCS <14, à magnitude da queda de GCS ou à duração em que o paciente permaneceu com GCS <14.

Não houve também diferenças estatisticamente significativas entre os grupos com relação aos testes de memória curta ou à incidência de lesões cerebrais clinicamente aparentes durante o tratamento para CAD.

Os testes de memória e de QI obtidos das crianças no seguimento após a resolução da CAD, igualmente, não mostraram diferenças significativas entre os grupos.

 

 

DISCUSSÃO

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Antonio Junior

Médico pediatra especializado em medicina intensiva pediátrica, com graduação e especialização pela Unicamp.
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