Finanças para Médicos

Como Montar uma Carteira de Ações de Boas Empresas

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Escolher boas empresas para se tornar sócio é uma tarefa importante de quem investe em renda variável. Aprenda quais são os sinais de saúde financeira e como analisá-los.

EDUCAÇÃO FINANCEIRA PARA MÉDICOS
dos primeiros passos ao primeiro milhão

Francinaldo Lobato Gomes *

MONTE SUA CARTEIRA DE AÇÕES
DE BOAS EMPRESAS

INTRODUÇÃO   

Um dos fatores determinantes para o sucesso do investimento em ações é a escolha de boas empresas para ser sócio. Ser sócio de boas empresas lhe trará tranquilidade e segurança, além de permitir que você permaneça com os papéis por longo período de tempo, recebendo os proventos e remunerando a carteira com a venda de opções.

Existem cerca de 420 empresas de 17 setores diferentes que negociam ações na B3. É preciso escolher, dentre elas, quais são as melhores para ser sócio. Veremos como fazer isso neste capítulo da série Finanças Pessoais para o profissional da saúde.

 

A ANÁLISE GRÁFICA E A ANÁLISE FUNDAMENTALISTA

Existem, basicamente, duas formas de olhar o mercado de ações: por meio da análise gráfica ou técnica ou por meio da análise fundamentalista.

Na análise técnica, o investidor busca lucrar com a variação no preço da ação, comprando na baixa e vendendo na alta. Para a tomada de decisão, ele utiliza os gráficos de preços, sobre os quais são aplicados vários indicadores que apontam os pontos de compra e venda. A estratégia usada chama-se trade, podendo ser day trade, swing trade ou mesmo position trade.

Usualmente, os investidores iniciantes começam a investir em ações realizando trades, porém sem nenhum conhecimento de análise gráfica e também sem dedicarem o tempo necessário para monitorizar o mercado, por conta de suas rotinas diárias de trabalho. Como consequência, acabam tendo prejuízos e desistem, por acharem que o mercado de ações é um cassino e que o sucesso depende de sorte ou de informação privilegiada.

analisando as acoes no mercado

Vejam bem, não estou dizendo que não é possível ter sucesso no investimento em ações sendo um trader. Apenas estou dizendo que, para ser um bom trader e ter sucesso, é preciso conhecer e aceitar as vantagens e desvantagens da estratégia grafista.

Neste texto, vocês aprenderão a olhar o mercado de ações pela ótica da análise fundamentalista. Por meio dela, serão capazes de escolher as melhores empresas para serem sócios e, também, serão capazes de monitorar a composição da carteira de ações por longo período de tempo, sabendo quando devem manter e quando devem substituir uma ou mais ações da carteira.

A escolha de boas empresas é a base para a estratégia chamada venda coberta de remuneração, uma estratégia simples, segura, fácil de ser implementada, que exige pouco tempo de monitorização do mercado e que proporciona retornos acima da renda fixa. A venda coberta de remuneração é feita em duas etapas. A primeira consiste em criar uma carteira de ações de boas empresas. Já a segunda consiste em remuner a carteira por meio da venda de opções sobre as ações.

Neste capítulo, vocês aprenderão a implementar a primeira etapa da estratégia. No próximo texto, apresentamos em detalhes a segunda etapa.

 

DETALHANDO A ANÁLISE FUNDAMENTALISTA

Nesta estratégia, vocês não devem ficar preocupados com o preço da ação, mas sim com o valor e a saúde da empresa. Uma das vantagens é a segurança, uma vez que as empresas escolhidas são boas e lucrativas. A outra vantagem é a possibilidade de remunerar a carteira com a venda de opções sobre as ações, trazendo ganho extra.

A análise fundamentalista mostra como escolher boas empresas para ser sócio. Tal como existem ferramentas utilizadas para avaliar a saúde de uma pessoa, existem ferramentas utilizadas para avaliar a saúde financeira de uma empresa.

Diferentemente do que ocorre na análise gráfica, na análise fundamentalista o investidor busca ganhar com a lucratividade e com a valorização da empresa ao longo do tempo e, com isso, receber cada vez mais proventos distribuídos por ela, em quantidade proporcional ao número de ações que tem.

Para a tomada de decisão, utilizam-se os demonstrativos financeiros divulgados periodicamente. A principal estratégia usada chama-se Buy & Hold, na qual as ações são compradas e mantidas na carteira por longo período de tempo, durante o qual há o recebimento dos proventos distribuídos pela empresa.

Todo o ganho obtido com os proventos e com a venda de opções (além dos aportes regulares vindos do planejamento financeiro) é usado para comprar mais ações e, com isso, aumentar o tamanho e o valor da carteira (veja figura a seguir).

como remunerar a carteira de acoes
Diferentes formas de remunerar a carteira de ações. Na fase de acumulação, é aconselhável usar os aportes regulares, os ganhos com proventos, os ganhos com a renda fixa e os ganhos com a venda de opções para comprar mais ações a aumentar o tamanho da carteira.
Após a leitura deste texto, vocês serão capazes de selecionar empresas que estejam lucrando e agregando valor para os acionistas. Mais importante ainda, vocês aprenderão a evitar empresas que vêm tendo desempenho ruim. Vocês serão capazes de separar o joio do trigo.

Reparem que este processo é um círculo virtuoso de ganhos. Quanto mais ações na carteira, maiores serão os ganhos com proventos e com a venda de opções (já que estes ganhos são proporcionais ao número de ações na carteira). Com estes ganhos maiores, mais ações poderão ser compradas, aumentando ainda mais o tamanho e o valor da carteira. Esse aumento na carteira de ações permitirá aumentar ainda mais os ganhos com proventos e com a venda de opções. E assim por diante, até que a carteira de ações alcance tamanho e valor grandes o suficiente para permitir que vocês possam viver de renda.

Ao contrário do que possa parecer, para avaliar corretamente uma empresa, não é preciso ser um expert em matemática ou em contabilidade.  Se isto fosse necessário, os contadores e matemáticos seriam os profissionais mais ricos do mercado. E esta não é a realidade. Existem alguns critérios simples e fáceis de usar que permitem, a qualquer investidor, saber se uma empresa é ou não adequada para ser sócio.

 

 

FERRAMENTAS DE ANÁLISE DA SAÚDE FINANCEIRA DE UMA EMPRESA

A análise fundamentalista permite saber o valor atual de uma empresa, sua saúde financeira e a perspectiva de aumento deste valor no futuro, comparando seu desempenho ao longo do tempo e também comprarando-a com outras empresas do mesmo setor. As ferramentas de análise são as demonstrações financeiras publicadas periodicamente, seguindo normas técnicas pré-estabelecidas. Usualmente, utilizam-se os relatórios anuais para a tomada de decisão. Essas demonstrações podem ser acessadas no site das empresas, no site da Bovespa ou mesmo em vários sites de finanças.

Em geral, as informações já costumam estar compiladas e planilhadas em diversos sites de finanças, de forma a facilitar a visualização e a análise dos dados, sem que seja necessário a busca direta nos relatórios. No entanto, é importante que vocês saibam a origem dos dados e também o significado deles para que possam aplicá-los na tomada de decisão.

 

DEMONSTRAÇÕES FINANCEIRAS

Grande parte das informações relacinadas ao desempenho de uma empresa deriva de suas demonstrações financeiras. São 3 as demonstrações financeiras que devem constar nos relatórios. 

  • Balanço patrimonial (BP): representa uma espécie de fotografia do patrimônio da empresa em um período de tempo, usualmente um ano. O BP informa quanto a empresa tem de ativo, quanto tem de passivo e qual o patrimônio líquido, isto é, quanto ela vale. O BP é sempre organizado em duas colunas, sendo a coluna da esquerda a coluna do ativo, sempre em ordem decrescente de liquidez, e a coluna da direita a coluna do passivo, sempre em ordem crescente de exigibilidade. A coluna do ativo é subdividida em ativo circulante, ativo não circulante, imobilizado e o intangível.

O ativo circulante representa os valores a serem recebidos em até 12 meses. O ativo não circulante representa os valores a serem recebidos em mais de 12 meses. O imobolizado representa a estrutura física e o maquinário necessário para as atividades operacionais. O intangível representa a marca, patente, capacidade de inovação, os investimentos em pesquisa e desenvolvimento, o modelo de negócios (ativos que não são palpáveis, mas que agregam valor a empresa).

A coluna do passivo é subdividida em passivo circulante (dívidas a serem pagas, isto é, exigíveis, em até um ano) e passivo não circulante (dívidas a serem pagas, isto é, exigíveis, em mais de um ano).

Abaixo da coluna do passivo está o patrimônio líquido, que representa o valor da empresa.

No balanço patrimonial, deve sempre constar os dados do ano anterior ao ano corrente, para fins de comparação. 

  • Demonstração do Resultado no Exercício (DRE): a DRE mostra a capacidada que a empresa tem de gerar receita a partir dos serviços prestados ou dos produtos vendidos e o quanto gastou para prestar os serviços, incluindo os tributos pagos. Por fim, ela mostra se o resultado foi positivo ou negativo, isto é, se houve lucro ou prejuízo. Da mesma forma que o BP, a DRE deve conter sempre os dados do ano anterior para fins de comparação.
  • Demonstração do Fluxo de Caixa (DFC): partindo do lucro líquido, a DFC mostra a movimentação do dinheiro dentro do caixa da empresa, resultando na quantia de dinheiro que sobra após serem pagas todas as contas; isto é, dinheiro este que fica, de fato, para a empresa.

 

LIMITAÇÕES DA ANÁLISE FUNDAMENTALISTA

Tal como qualquer tipo de análise de mercado, a análise fundamentalista apresenta algumas limitações que devem ser conhecidas. 

 

USAR DADOS PASSADOS PARA PROJETAR O FUTURO: a análise fundamentalista baseia-se no desempenho passado de uma empresa para projetar o desempenho futuro. No entanto, sabemos que o futuro é incerto. Por exemplo, o fato de uma empresa ter lucrado em um ano não garante que ela irá lucrar no ano seguinte – ou mesmo que irá continuar lucrando. Empresas são geridas por seres humanos e seres humanos algumas vezes tomam decisões erradas.

Entretanto, o fato de uma dada empresa vir apresentando lucro e crescimento consistentes nos últimos cinco anos, por exemplo, mostra que ela vem sendo bem administrada e fazendo uso correto do seu capital. Portanto, tem grande chance de continuar lucrando e crescendo. Assim, embora não haja certeza absoluta, é possível trabalhar com alto grau de probabilidade de um evento continuar a ocorrer pelo fato de ele vir ocorrendo nos últimos cinco anos, por exemplo.

 

DADOS CONTÁBEIS SÃO SUJEITOS À MANIPULAÇÃO: embora esteja cada vez mais difícil de ocorrer, ainda vemos situações em que os números são manipulados com o intuito de esconder falhas administrativas (ou mesmo desvios de conduta). Como os acionistas são os sócios ausentes da empresa, eles devem cobrar transparência do conselho de administração, sempre que houver dúvidas a respeito dos números.

Por conta das novas políticas de governança corporativa, visando melhorar a transparência, ampliar os direitos dos acionistas e a realização de auditoria externa independente, a manipulação de dados está ficando cada vez mais rara, principalmente porque gera desconfiança nos investidores e perda de credibilidade da empresa. No entanto, deve-se sempre ficar atento a esta possibilidade e olhar o parecer da auditoria externa a respeito dos números apresentados pela empresa da qual vocês são sócios.

 

ASSIMETRIA NA DISTRIBUIÇÃO DAS INFORMAÇÕES: houve um tempo em que este fato ocorria com mais frequência. Atualmente, por conta da lei das S.As e também por conta da governança corporativa, as informações são divulgadas simultaneamente para todo o mercado.

O que se observa, na verdade, é assimetria na busca por informações e não na distribuição delas. Muitos investidores não lêem os relatórios nem acompanham o desempenho das empresas das quais são sócios, tomando suas decisões com base no que a mídia divulga ou seguindo dicas de terceiros. Ora, quando uma notícia boa ou ruim sobre uma dada empresa é divulgada na mídia, na grande maioria das vezes já se passaram meses ou mesmo anos desde que o fato ocorreu. A análise fundamentalista detecta os sinais de que uma empresa está melhorando ou piorando muito antes da repercussão na mídia.

 

DECISÕES ERRADAS: como dito antes, empresas são geridas por seres humanos – e seres humanos erram. Tenham cuidado ao se depararem com uma diretoria que só toma decisões corretas. Este pode ser um sinal de manipulação dos números. Não é raro uma empresa investir em projetos que se mostram falhos, ou mesmo que dão prejuízos. No entanto, decisões erradas fazem parte da rotina do mercado. O importante é ficar atento se a diretoria reconhece o erro e se propõe a corrigi-lo. Isto pode ser visto na carta aos acionistas que consta no relatório anual. E, claro, no ano seguinte, deve-se conferir se o erro foi ou não corrigido.

 

Diante de todas estas limitações, o que deve ser feito para minimizar os riscos?

 

COMO MINIMIZAR OS RISCOS NA HORA DE COMPRAR AÇÕES?

  1. Escolham empresas bem geridas: empresas que aceitam ser mais transparentes, submeterem-se à auditoria externa independente e ampliar os direitos aos acionistas, por exemplo, demonstram seriedade e honestidade por parte da diretoria. 
  1. Comparem os dados por um período de pelo menos cinco anos: uma empresa que venha apresentando bom desempenho nos últimos cinco anos, mesmo que tenham ocorridas algumas decisões erradas, tem mais chance de continuar tendo bom desempenho nos anos seguintes. 
  1. Ajustem a carteira de ações periodicamente: tal como mostrado para a carteira de investimentos, a carteira de ações deve ser ajustada periodicamente para avaliar a permanência ou a troca de ações. Isto pode ser feito juntamente ao ajuste da carteira de investimentos, no mês de aniversário. 
  1. Protejam a carteira de ações: tal como a blindagem do patrimônio, a carteira de ações deve ser protegida das oscilações do mercado. Isto é feito por meio da venda de opções, tópico que veremos no próximo texto. 
  1. Estabeleçam e sigam critérios para se tornarem sócios: mesmo os profissionais de mercado não conseguem analisar todas as variáveis envolvidas na tomada de decisão sobre a compra ou a venda de ações de uma dada empresa. Portanto, é preciso estabelecer critérios que tornem o processo de tomada de decisão mais fácil e que, principalmente, desconsiderem o fator emocional.

A seguir, veremos quais são os principais critérios a serem levados em conta a partir dos dados fornecidos no relatório anual. Ressaltamos, novamente, que os dados costumam estar disponíveis, já compilados e planilhados em diversos sites de finanças, porém é importante conhecer a origem deles e saber como devem ser usados para a tomada de decisão.

 

O QUE PROCURAR NO RELATÓRIO ANUAL?

analisando demonstracoes financeiras

Há muitas outras informações importantes no relatório anual e que podem ter utilidade, porém vocês devem se ater ao que é mais importante para a tomada de decisão.

Ao ler o relatório anual de uma empresa, comumente surge uma impressão: parece algo impossível de ser interpretado. No entanto, se vocês souberem o que procurar, o trabalho fica bem mais fácil. Por isso, minha dica é: concentrem-se no que realmente interessa. A despeito da complexidade do assunto, compensa conhecê-lo um pouquinho mais, de maneira guiada. Afinal, saber quanto vale uma empresa e seus ativos é fundamental em qualquer estratégia de investimento.

Abaixo, de forma sucinta, vocês verão o que deve ser procurado no relatório anual de qualquer empresa. Os relatórios anuais seguem um determinado padrão. Ao ler e entender um relatório, vocês serão capazes de ler todos os demais.

 

  1. NÍVEL DE GOVERNANÇA CORPORATIVA

Uma empresa que adota um bom nível de governança corporativa pode ser considerada mais transparente com seus acionistas, pois significa que ela está disposta a cumprir obrigações que vão além das exigidas pela Lei das S.A.. Isso gera vantagens aos acionistas, pois a empresa estará divulgando informações mais completas ao mercado, o que reduz o risco e, consequentemente, gera mais confiança e melhor precificação de suas ações.

 

SEGMENTOS DE LISTAGEM 

Nível tradicional: as empresas deste nível cumprem apenas com as obrigações básicas exigidas pela Lei das Sociedades por Ações (Lei das S.A.).

Nível 1: empresas que se comprometem a cumprir regras que vão além das exigidas pela Lei das S.A. Além disso, a empresa deve se esforçar no que se refere à dispersão acionária (diluição das ações nas mãos de pessoas diferentes) e deve ter, mínimo, 25% de suas ações em circulação no mercado (free float), o que se reflete na liquidez da ação. Assim como no nível tradicional, as companhias podem emitir ações ordinárias e preferenciais, porém, em caso de venda da empresa, os acionistas minoritários recebrão até 80% do valor recebido pelos acionistas controladores (tag along). 

Nível 2:  empresas que se comprometem a cumprir as regras aplicáveis ao Nível 1 e, adicionalmente, outras práticas de governança relativas aos direitos societários dos acionistas minoritários. As empresas devem adotar a Câmara de Arbitragem do Mercado para solução de conflitos relacionados ao mercado de capitais e societários, além de divulgar suas Informações financeiras em padrão internacional. A diferença para o Novo Mercado é que as companhias podem emitir ações Ordinárias e Preferenciais e oferece tag along de 100% para os dois tipos. 

Novo Mercado: este é considerado o nível mais elevado de governança corporativa. As companhias que estão neste segmento de listagem só podem emitir ações ordinárias, com tag along de 100%. De resto, possui as mesmas obrigações do Nível 2. 

Bovespa Mais Nível 1: segmento que ajuda as empresas, principalmente de pequeno e médio porte, a ingressarem e se adaptarem gradativamente ao mercado e aos compromissos de uma companhia aberta. Durante esse período de adaptação, a empresa costuma atrair investidores.

Assim como no Novo Mercado, só são permitidas ações ordinárias com tag along de 100% e as empresas devem aderir à Câmara de Arbitragem do Mercado. Outro ponto importante é que as companhias possuem prazo de 7 anos para atingir um free float equivalente a 25% do capital. Exatamente por isso, as ações de empresas listadas nesse segmento costumam ter liquidez baixa, o que as torna mais interessantes para quem investe visando um prazo mais longo. 

Bovespa Mais Nível 2: mesmas regras do Bovespa Mais Nível 1, com a diferença que a empresa pode emitir ações ordinárias, que têm direito a voto, e também de ações preferenciais. Ambas devem ter tag along de 100%.

Uma importante dica para quem quer selecionar ações com bom nível de governança é começar dando uma olhada nas ações dos índices IGCX (índice de ações com governança corporativa), ITAG (índice de ações com tag along), IGCT (índice de ações com governança corporativa trade) e IGC-NM (índice de ações com governança corporativa Novo Mercado). No site da B3 existe uma tabela com o comparativo dos níveis de governança corporativa e os rótulos designativos de cada nível.

 

  1. GRAU DE LIDERANÇA E MARGEM DE SEGURANÇA 

Como já visto no texto anterior, existem 17 setores na B3, e cada um com várias empresas. Um princípio básico da diversificação diz que não se deve ser sócio de várias empresas de um mesmo setor. Por exemplo, não é eficiente ter ações apenas de bancos ou apenas de siderúrgicas ou mesmo apenas de varejo. Isto porque na hipótese de um destes setores entrar em crise, todas as empresas do setor sofrerão.

Assim, dentro de um setor, deve-se escolher a melhor empresa para ser sócio. Para saber qual a empresa é a melhor, usa-se dois indicadores retirados das demonstrações financeiras.

O primeiro é o Retorno Sobre o Patrimônio Líquido (RSPL). Ele é obtido dividindo-se o Lucro líquido (retirado da DRE) pelo Patrimônio Líquido da empresa (retirado do BP). O resultado é multiplicado por 100, resultando em valores percentuais.

A fórmula é a seguinte: RSPL = (LL/PL) * 100.

Se uma empresa é lider de mercado, então ela deve obter o maior retorno sobre seu patrimônio em comparação com as suas concorrentes.

Vocês devem selecionar empresas que sejam líderes em seus setores e que estejam conseguindo manter, ou até mesmo ampliar, esta liderança. Assim, vocês terão maior garantia de sucesso.

Se uma empresa tem um RSPL de 20%, por exemplo, significa que ela tem um rendimento de 20% sobre o seu valor. Quanto maior o RSPL, melhor e mais eficiente é a empresa. Alto RSPL significa que a diretoria está usando o dinheiro de forma adequada e eficiente, agregando valor aos acionistas.

Embora não exista um número mágico, uma boa empresa deve ter RSPL igual ou superior a 15%. O RSPL deve ser comparado ao longo dos últimos três ou cinco anos para avaliar se o desempenho vem se mantendo. Além disso, deve-se comparar o RSPL da empresa com o RSPL das concorrentes para avaliar se o desempenho está acima da média das empresas do setor.

O segundo indicador é a Margem Líquida. Ela é obtida dividindo-se o Lucro Líquido (retirado da DRE) pela Receita de Vendas (retirada também da DRE). O resultado é multiplicado por 100, resultando em valores percentuais.

A fórmula é a seguinte: ML = (LL / Receita)*100

A ML mostra o quanto fica para a empresa de cada um real obtido em vendas. Uma empresa que tenha boa margem de segurança deve ser capaz de obter lucros maiores do que as concorrentes.

Se uma empresa tem uma ML de 15%, por exemplo, significa que cada R$1 obtido em vendas rende 15%, ou seja, R$0,15 (quinze centavos). Quanto maior a ML, melhor é a empresa. Da mesma forma que o RSPL, não existe um número mágico para a ML, mas aceita-se que uma empresa boa deva manter ML acima de 10%.

Amplas MLs indicam boa margem de manobra com relação aos lucros quando ocorrerem turbulências de mercado. Por exemplo, em épocas de crise, caso a empresa precise baixar os preços dos produtos, ainda assim ela manterá bons rendimentos.

A ML funciona como o lastro em um balão. Se, numa turbulência, o balão começar a perder altitude, pode-se abrir mão do lastro e impedir que o balão caia. Assim, empresas com amplas margens costumam sobreviver a períodos (inclusive longos) de turbulência.

Da mesma forma que o RSPL, a ML deve ser comparada ao longo dos últimos três ou cinco anos para avaliar se o desempenho vem se mantendo. Além disso, deve-se comparar a ML da empresa na qual estamos interessados com a ML das empresas concorrentes para avaliar se o desempenho está acima da média das empresas do setor.

Deve-se lembrar que tanto a liderança de mercado quanto a margem de segurança podem não durar para sempre. Assim, uma vez que vocês ficaram sócios de uma dada empresa, vocês devem acompanha-la periodicamente para ver se ela está conseguindo manter a vantagem sobre as concorrentes.

 

  1. ANÁLISE DE DESEMPENHO 

Antes de investir numa dada empresa, é importante saber como está sendo o desempenho quanto ao lucro líquido (LL), ao crescimento das vendas e ao crescimento do lucro por ação (LPA). 

Crescimento do LL: as boas empresas possuem LL crescente ao longo dos anos. Parte do lucro gerado é repassada aos acionistas sob a forma de proventos e boa parte é incorporada ao patrimônio líquido da empresa, fazendo com que ela aumente seu valor. Um crescimento do LL acima de 5% ao ano é considerado adequado.

O LL é visto na DRE e deve ser comparado por pelo menos 3 a 5 anos. Empresas que apresentam LL crescente são boas empresas para ser sócio. 

Crescimento das vendas: as boas empresas aumentam suas vendas anualmente. O crescimento das vendas deve ser comparado com outras empresas do mesmo setor. Empresas que conseguem aumentar suas vendas em, pelo menos, 5% ao ano são boas opções de investimento. Para avaliar o crescimento das vendas, olha-se a receita na DRE, que deve ser crescente quando comparada aos anos anteriores. 

Crescimento do Lucro por Ação (LPA): todo acionista quer saber qual será o seu lucro em função do número de ações que se tem. Para saber qual será o LPA, basta dividir o lucro líquido pela média das ações emitidas. Também deve-se examinar o crescimento do Lucro por Ação. Empresas boas conseguem aumentar o LPA de forma consistente, em geral, acima de 5% ao ano.

 

  1. PERFIL DE ENDIVIDAMENTO

Toda empresa de capital aberto apresenta algum grau de endividamento, pois precisa recorrer a capital de terceiros para financiar suas obras de expansão. No entanto, deve-se lembrar que todas as dívidas devem ser pagas, juntamente com os juros. Portanto, uma empresa boa deve manter um grau de endividamento que seja aceitável, para não comprometar sua lucratividade nem seu crescimento.

Avalia-se o perfil de endividamento por meio de dois indicadores, que são:

Índice de Liquidez Corrente (ILC): informa quanto de ativo circulante a empresa tem para cada passivo circulante. Ele indica a capacidade de pagamento das dívidas de curto prazo (até um ano). Empresas que não possuem ativo circulante suficiente para honrar o passive circulante poderão ter problemas para pagar os funcionários, fornecedores e alguns tributos. Empresas boas devem manter ILC maior que 1, o que indica que existe mais ativo circulante do que passive circulante, ou seja, mais recursos do que dívida de curto prazo.

Índice de Solvência (IS): indica se a empresa está sendo capaz de gerenciar suas dívidas de longo prazo, ou seja, indica a solvência da empresa. Quando uma empresa pega dinheiro emprestado, ela tem que pagar os juros e o principal desta dívida. Se a quantidade de dinheiro for muito grande, ou se os juros forem muito altos, parte dos lucros será usada para pagar a dívida, o que diminuirá o lucro para os acionistas.

Para calcular a solvência, divide-se as dívidas de longo prazo pelo patrimônio líquido. Isto mostra o quanto do patrimônio líquido da empresa está comprometido com o pagamento da dívida. Escolha empresas que sejam capazes de financiar suas operações e expansão com o caixa gerado pelo negócio. Desta forma, elas não terão que pagar juros, o que aumenta o lucro para os acionistas. Em geral, um IS de até 30% é aceitável. Entre 30 e 50% é tolerável. IS acima de 50% mostra que a empresa corre alto risco de ficar incapaz de pagar suas dívidas e, portanto, tornar-se insolvente.

 

  1. FLUXO DE CAIXA LIVRE (FCL) 

Mostra se a empresa realmente está ganhando dinheiro. Se uma empresa está tendo lucro, isto não significa que ela esteja ganhando dinheiro. O lucro pode estar sendo usado para comprar matéria-prima, pagar juros e o principal de dívidas, pagar salários atrasados etc. O número que mostra o dinheiro que a empresa está realmente ganhando é o Fluxo de Caixa Livre (FCL). Ele diz quanto dinheiro realmente sobrou depois que todas as despesas foram pagas e depois que foram realizados os investimentos. É este dinheiro que deve ser bem empregado pela diretoria da empresa de forma a aumentar o lucro para os acionistas.

O FCL nos ajuda a separar as empresas “produtoras de dinheiro” das “consumidoras de dinheiro”.

O FCL é obtido a partir da Demonstração dos Fluxos de Caixa. Ele resulta da diferença entre as disponibilidades líquidas e as despesas de capital. Quanto maior o FCL, melhor será a empresa. 

A ESCOLHA DE BOAS EMPRESAS

escolhendo uma empresa lucrativa

Para resumir este texto, vejamos como usar os critérios para selecionar e monitorar as ações a serem mantidas em carteira.

O primeiro passo é saber quantos, dos cinco critérios apresentados aqui, a empresa preenche. Vale lembrar que, dificilmente, haverá uma empresa que consiga preencher todos os critérios acima mencionados. Por isso, aceita-se que o número mínimo de critérios a serem cumpridos é 3 dos 5 critérios mostrados acima. Apenas usando este crivo vocês já conseguirão se manter longe de empresas ruins.

Uma vez selecionada a empresa, vocês farão o acompanhamento anual do desempenho dela com relação aos critérios escolhidos. Esta análise pode ser feita juntamente com o ajuste da carteira, no mês de aniversário. No momento do ajuste, três cenários são possíveis:

  1. A empresa manteve os 3/5 critérios, ou mesmo ganhou mais critérios. Neste caso, as ações deverão ser mantidas na carteira. Isto é, vocês não somente manterão as ações que já têm, mas continuarão a comprar mais ações.
  1. A empresa perdeu um critério. Neste caso, as ações deverão ficar em quarentena. Isto significa que vocês ainda não venderão as ações que já têm, mas também não comprarão mais ações da empresa. Vocês darão mais um ano para ela se recuperar. Afinal de contas, esta pode ser uma situação temporária. Se, após um ano, ela recuperar o critério, vocês continuarão com ela e continuarão comprando mais ações. Caso ela não recupere ou mesmo perca mais critérios, vocês terão que se desfazer das ações e buscarão outra empresa para serem sócios, uma empresa que atenda aos critérios.
  1. A empresa perdeu dois ou mais critérios. Neste caso, vocês já devem se desfazer das ações e buscar outra empresa.

Usem a árvore de decisões mostrada abaixo, baseada nos critérios mencionados acima.

carteira de acoes - arvore de decisoes
Clique para ver ampliada

A principal vantagem desta árvore decisória é que ela elimina o fator emocional no momento de escolher ou de se desfazer das ações. Ao eliminar o fator emocional, vocês aumentarão as chances de sucesso. E, o mais importante, não se tornarão sócios e nem manterão na carteira de vocês empresas ruins.

Antes de concluir este texto, quero deixar uma mensagem que irá garantir a sobrevivência de muitos no mercado de ações.

Nunca se casem com uma empresa! Fiquem com ela enquanto ela estiver satisfazendo seus critérios. Caso a empresa deixe de satisfazer os critérios, desfaçam-se dela e busquem outra.

 

Para concluir, caros investidores, para terem sucesso com o investimento em ações é preciso que se tornem sócios de empresas boas e lucrativas. Isto lhes garantirá a segurança do investimento por um longo período de tempo. Apesar de parecer difícil, o processo de escolha de boas empresas é perfeitamente acessível a qualquer investidor, desde que ele saiba o que procurar. Usando os critérios mostrados neste texto, vocês conseguirão montar uma carteira de ações que será vencedora no longo prazo.

Ótimos investimentos a todos.

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Dr. Francinaldo Gomes

Neurocirurgião. Mestre em Neurociências. Autor dos livros "Bolsa Valores para Médicos" (Editora DOC, 2012) e "Finanças no Consultório: como Maximizar os Resultados" (Editora DOC, 2016). Escritor da coluna "Investimentos" da revista DOC e da revista SBN Hoje. Especialista em investimento em ações e mercado de opções (CMA Educacional). MBA em finanças com ênfase em gestão de investimentos (FGV). Membro da Comissão de Apoio, Qualificação e Gestão Empresarial da Sociedade Brasileira de Neurocirurgia.

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