Tecnologia

Estudo: uso moderado de jogos eletrônicos traz benefícios ao desenvolvimento infantil

Compartilhe conhecimento:

Pesquisa envolveu mais de 4 mil crianças e aponta melhoras cognitivas em usuários moderados de games. Uso baixo ou demasiado indica problemas.

 

No Brasil, uma pesquisa realizada em 2013 mostrou que 44% dos jovens possuem ao menos um aparelho de videogame em casa. Outro estudo, de 2015, verificou que mais de 82% dos brasileiros jogam no celular. Dada a rápida evolução do mercado de jogos e dispositivos eletrônicos, esses números tendem a crescer a cada ano, assim como sua influência nas crianças.

Muitos pais acreditam que jogos eletrônicos – de celulares, computadores ou consoles – podem ser problemáticos, ou até mesmo perigosos, para seus filhos. Mas será que eles têm razão? Se, por um lado, jogos eletrônicos em excesso parecem, de fato, ter um efeito negativo no desenvolvimento social e emocional das crianças, por outro, um uso moderado pode ter efeitos benéficos.

A afirmação é resultado dos dados de 2017 de um estudo australiano chamado Growing Up in Australia: Longitudinal Study of Australian Children, que envolveu mais de 4 mil crianças do país. Entre as principais motivações da pesquisa está o fato de que jogos eletrônicos estão presentes em 90% dos lares australianos; em 65% deles, há mais de três dispositivos para se jogar (no Brasil, o número de ‘jogadores’ também é alto – veja no quadro ao lado).

 

A INFLUÊNCIA DOS JOGOS NO DESENVOLVIMENTO

Para realizar o trabalho, em um primeiro momento, os pesquisadores pediram aos pais de cada criança, que tinham entre 8 e 9 anos de idade, para registrarem quantas horas por semana seus filhos passavam brincando com jogos eletrônicos. Dois anos depois, os professores dessas mesmas crianças, que agora estavam com 10 e 11 anos, avaliaram o desempenho acadêmico e o desenvolvimento social e emocional dos seus alunos.

O estudo analisou a influência dos jogos eletrônicos no desenvolvimento de crianças entre 08 e 11 anos

O primeiro resultado do estudo: cerca de um terço (33%) das crianças jogava, em média, menos de 2 horas por semana – uso considerado baixo. Entretanto, aproximadamente um quarto delas (24%) manteve um uso considerado alto – mais de sete horas por semana. Veja com mais detalhes no gráfico abaixo:

envolvimento das criancas com jogos eletronicos

Dois anos depois, analisando a avaliação escolar dessas crianças, os pesquisadores verificaram que o grupo com melhor desempenho acadêmico era aquele de uso baixo-moderado, que brincavam com jogos eletrônicos entre duas e quatro horas por semana.

 

As crianças que jogavam pouco videogame, além de terem melhores habilidades em matemática e inglês, pareciam ter também melhor desenvolvimento emocional.

 

Porém, isso não significa que o videogame seja um inimigo do aprendizado. Surpreendentemente para os pesquisadores, as crianças que jogaram menos de 2 horas por semana tinham um desempenho acadêmico e emocional pior do que a do grupo baixo-moderado, mesmo levando-se em consideração aspectos socioeconômicos. Entretanto, o uso excessivo de jogos eletrônicos – mais de sete horas por semana – teve um efeito negativo no desenvolvimento social e interpessoal. Crianças desse grupo tiveram os piores níveis de atenção, menores habilidades de se concentrar em tarefas e mais dificuldades emocionais.

jogos eletronicos e criancas - resultados dos estudos
Clique para ver os dados em maior resolução

 

JOGOS QUE ESTIMULAM A INTERAÇÃO ‘REAL’ SÃO MELHORES

Um estudo realizado por pesquisadores das Universidades de Alberta, Toronto e British Columbia, todas canadenses, e publicado no último mês no periódico International Journal of Behavioural Nutrition and Physical Activity sugere que crianças não deveriam brincar com dispositivo eletrônico até 1h antes de dormir. Tal uso implica em pior qualidade do sono, com menos horas dormidas e mais interrupções, além de aumento nas chances de sobrepeso e obesidade.

Apesar dos resultados do estudo indicarem que um uso moderado de diversões eletrônicas é algo salutar para os jovens, os pesquisadores afirmam que “a relação entre o uso de jogos eletrônicos e o desenvolvimento e o desempenho acadêmico de crianças está longe de ser totalmente compreendida“.

Eles ressaltam que a qualidade dos jogos e o contexto familiar desempenham papéis fundamentais para os pequenos. Jogos que oferecem a oportunidade de colaboração com outras pessoas, ao mesmo tempo em que propõem a resolução de problemas (o sucesso ‘Minecraft’,  com mais de 100 milhões de cópias vendidas e no qual as crianças podem criar mundos e interagir com outros jogadores, foi citado como exemplo disso), podem ser benéficos para as crianças.

Mais importantes do que o jogo em si talvez sejam as interações sociais que ocorrem durante o momento da diversão. Outros estudos já haviam mostrado que quando pais ou irmãos participam dos jogos, eles frequentemente se envolvem em conversas com as crianças e negociam com elas, o que pode potencialmente contribuir para o desenvolvimento social, cognitivo e de linguagem.

criancas brincando com minecraft

Os pesquisadores ressaltam, portanto, que informações sobre o contexto em que a criança brinca – como, por exemplo, qual jogo que está sendo usado, com quem elas estão jogando e, até mesmo, quais dispositivo são utilizados – são claramente relevantes para explorar em maior profundidade a relação entre os jogos eletrônicos e o desenvolvimento dos jovens.

Enquanto um consenso sobre o tempo ideal dos jogos na rotina das crianças ainda não é definido, vale orientar os pais a manter controle sobre as horas jogadas e estimular os games que promovem interações e resolução de problemas. Além disso, ensinar as crianças a evitar dispositivos eletrônicos até 1h antes de dormir, trocando-os por livros, por exemplo, também é indicado.

PARA SABER MAIS

  • Estudo ‘Growing up in Australia’, um amplo compêndio anual de pesquisas multidisciplinares patrocinado pelo governo australiano sobre o desenvolvimento das crianças e dos jovens no país: http://www.growingupinaustralia.gov.au/
  • Walker, Sue, Hatzigianni, Maria, & Danby, Susan J. Electronic gaming: Associations with self-regulation, emotional difficulties and academic performance. In Digital Childhoods : Technologies in Children’s Everyday Lives. Springer, 2017.
  • O estudo sobre videogames foi publicado como capítulo do livro ‘Digital Childhoods : Technologies in Children’s Everyday Lives’, editado este ano pela Queensland University of Technology.
  • Dube N, Khan K, Loehr S, Veugelers P. The use of entertainment and communication technologies before sleep could affect sleep and weight status: a population-based study among children. Int J Behav Nutr Phys Act. 2017; 14: 97.
Mostrar mais

PortalPed

Somos um grupo de pediatras que adoram compartilhar conhecimentos sobre a profissão com nossos colegas, com estudantes de Medicina e com o público no geral. Venha conosco nesta jornada de aprendizado!

Artigos Relacionados

Botão Voltar ao topo