Encefalite Viral Aguda: definição, diagnóstico e tratamentos
Entenda um dos problemas neurológicos mais complexos para se diagnosticar a determinar as causas. Uma revisão completa sobre as encefalites.
Todos os anos, aproximadamente 7 em cada 100.000 pessoas são hospitalizadas nos EUA com encefalite [3], sendo que nos menores de 1 ano esses números praticamente dobram: 13,5 a cada 100.000 crianças necessitam de internações [4].
A encefalite viral é um desafio em seu diagnóstico e manejo clínico, dada a heterogeneidade de sua apresentação e a miríade de agentes causais possíveis. [4] Basicamente, trata-se de uma síndrome causada por uma inflamação (infecciosa ou não) do parênquima encefálico associada à “disfunção neurológica”. Esse termo amplo se traduz, na apresentação clínica, por “estado mental alterado”, seja por redução do nível de consciência, seja por letargia, mudança de personalidade ou comportamento anormal; convulsões; e/ou sinais neurológicos focais, por vezes acompanhados de febre, náuseas e vômitos [5]. A propedêutica armada pode indicar pleocitose no líquido cefalorraquidiano (LCR) e alterações em exames de neuroimagem e eletroencefalografia (EEG).
ENCEFALITE: ETIOLOGIA E PADRÕES EPIDEMIOLÓGICOS
Nos EUA, a causa da encefalite é desconhecida em aproximadamente metade dos casos [3], podendo chegar a 63% em alguns estudos [6]. Dos casos conhecidos, 20 a 50% são atribuídos a vírus. O vírus da herpes simples (HSV) representa de 50 a 75% dos casos virais identificáveis, com o vírus da varicela zoster (VZV), os enterovírus e os arbovírus somando a maioria dos casos remanescentes [3].
OUTRAS CAUSAS
Das causas identificáveis, bactérias são responsáveis por cerca de 16% dos casos, enquanto 7% são causadas por doença priônica, 3% por parasitas e 1% por fungos [4].
Das crianças hospitalizadas, aproximadamente 40% necessitam de cuidados intensivos, com uma permanência média nessas unidades de 16 dias [7]. Para os americanos, a média estimada de gastos com a hospitalização, de acordo com o agente, varia de US$ 58.000 a US$ 89.600 por paciente com encefalite viral. Lá, há aproximadamente 6.000 hospitalizações por ano por esse diagnóstico, estimando-se um custo anual de 350 a 540 milhões de dólares, fora os custos dos cuidados após a desospitalização, os custos para os cuidadores e os dias perdidos de trabalho [3].
Em nosso meio, com o advento das constantes epidemias de dengue, observou‐se um novo perfil etiológico nas encefalites virais em pacientes imunocompetentes: a dengue aparece como principal causa (47%), seguida pelo HSV‐1 (17,6%), citomegalovírus (CMV) e enterovírus (5,8%), não se determinando a etiologia em 23,5% dos casos [8].
APRESENTAÇÃO CLÍNICA DAS ENCEFALITES
As manifestações de encefalite variam de acordo com o agente viral, a região do encéfalo afetada (podendo ser mais de uma), a idade do paciente e seu status imunológico.
Neonatos e lactentes jovens tendem a apresentar quadros mais inespecíficos, podendo se manifestar com…
- febre,
- convulsões,
- inapetência ou
- letargia.
Crianças mais velhas e adolescentes, por sua vez, podem demonstrar…
- febre,
- sintomas psiquiátricos,
- labilidade emocional,
- transtornos do movimento,
- ataxia,
- convulsões,
- estupor,
- letargia ou
- mudanças neurológicas localizadas, como hemiparesia ou alterações nos nervos cranianos.
Casos graves podem se apresentar com estado de mal epiléptico, edema cerebral (e suas manifestações clínicas), secreção inapropriada de hormônio antidiurético e/ou falência cardiorrespiratória [5].
Assim, a encefalite viral é uma emergência aguda e potencialmente fatal que requer avaliação e intervenções imediatas, assegurando-se a estabilização cardiorrespiratória e o controle das crises convulsivas, nos casos em que isso se faz necessário.
Anamnese
A anamnese deve incluir considerações da estação do ano em que o paciente adoeceu, localização geográfica, viagens e possíveis doenças a que foi exposto, contato com animais, estado de saúde dos familiares, contato com pessoas doentes e casos conhecidos de encefalite na área de convívio. Condições médicas subjacentes, como o uso de medicações, antecedentes pessoais patológicos, imunossupressões, uso de drogas e práticas sexuais (no caso de adolescentes) também são de conhecimento importante.
O exame físico e neurológico fornece pistas sobre as causas potenciais e pode guiar os exames a serem solicitados [3].
Pela dificuldade em se estabelecer um consenso de caso suspeito de encefalite (com implicações em padronização das abordagens diagnósticas), um consórcio formado por especialistas do mundo todo lançou em 2013 um consenso contendo algoritmos para a definição de caso e diagnóstico em adultos e crianças [9]. O algoritmo de critérios diagnósticos é apresentado abaixo:
Tabela 1. Critérios Diagnósticos para Encefalite e Encefalopatia de Etiologia Infecciosa ou Autoimune Presumível
CRITÉRIO MAIOR (necessário) | Pacientes que se apresentam em uma consulta com estado mental alterado (definido como nível de consciência diminuído ou alterado, letargia ou mudança de personalidade) com duração ≥24 horas e sem causa alternativa identificável |
Pacientes que se apresentam em uma consulta com estado mental alterado (definido como nível de consciência diminuído ou alterado, letargia ou mudança de personalidade) com duração ≥24 horas e sem causa alternativa identificável | |
CRITÉRIOS MENORES (necessários 2 para encefalite possível; ≥3 para encefalite provável ou confirmada) | Febre documentada ≥38 °C até 72 horas antes ou após a apresentação |
Convulsões generalizadas ou parciais não totalmente atribuíveis a epilepsia pré-existente | |
Aparecimento de achados neurológicos focais novos | |
Contagem de leucócitos em LCR ≥5 células/mm3 | |
Anormalidades do parênquima cerebral em exames de neuroimagem sugestivas de encefalite que tanto podem ser novas em relação a exames prévios, quanto parecerem agudas na apresentação | |
Anormalidades no EEG que sejam consistentes com encefalite e não atribuíveis a outras causas |
Adaptado de Venkatesan A et al. Case Definitions, Diagnostic Algorithms, and Priorities in Encephalitis: Consensus Statement of the International Encephalitis Consortium. Clin Infect Dis. 2013
Como pode-se perceber, alguns dos critérios menores incluem exames de neuroimagem, EEG e pleocitose liquórica, para que se faça a suspeita de encefalite, de modo que podemos inferir que a mera apresentação do critério maior (alteração do estado mental) é condição para que se desencadeie a busca de alterações na propedêutica armada.
Alguns outros pontos de esclarecimento em relação a eles são importantes:
- Encefalopatia se refere à clínica de estado mental alterado, manifestado como confusão, desorientação, mudanças no comportamento ou outros déficits cognitivos, com ou sem inflamação do tecido cerebral. A encefalopatia sem inflamação pode ser desencadeada por um grande número de condições tóxicas ou metabólicas, mas também pode estar associada a agentes infecciosos específicos, tais como a Bartonella henselae ou o vírus influenza. Difere da encefalite pelo fato da última ser caracterizada por inflamação do parênquima encefálico através de infecção direta deste tecido, um processo pós-infeccioso como a encefalomielite disseminada aguda (acute disseminated encephalomyelitis — ADEM) ou por uma condição como a encefalite por anticorpos antirreceptor do N-metil-D-aspartato (NMDAR);
- Encefalite confirmada, como escrito em “Critérios Menores”, requer um dos seguintes achados:
- Confirmação anatomopatológica de tecido cerebral consistente com encefalite;
- Evidência patológica, microbiológica ou sorológica definidora de infecção aguda com microrganismo fortemente associado a encefalite em uma amostra clínica apropriada;
- Evidência laboratorial ou condição autoimune fortemente associada a encefalite;
- Febre é um achado comum na encefalite, mas é inespecífica. Os autores escolheram restringir o período de aparecimento da febre para até 72 horas após a hospitalização para excluir possíveis infecções nosocomiais secundárias. Como sua natureza é flutuante, ela pode estar ausente na apresentação do paciente aos cuidados médicos e mesmo não ocorrer em pacientes imunossuprimidos;
- Convulsões na encefalite podem ser generalizadas, sugerindo disfunção global do sistema nervoso central (SNC), ou focais, indicando processo localizado. Convulsões febris são relativamente comuns em crianças pequenas e, ocorrendo isoladamente, não orientam a pesquisa para encefalite. De fato, os autores sugerem a alteração do estado mental por pelo menos 24 horas justamente para excluir os casos de estados pós-ictais que sucedem as crises febris;
- Pleocitose no LCR sugere processo inflamatório no parênquima encefálico, na meninge ou em ambos (meningoencefalite). A ausência de pleocitose, no entanto, não exclui encefalite [9].
DIAGNÓSTICO DA ENCEFALITE
Para padronizar a abordagem em estudos multicêntricos e colaborativos e fornecer uma ferramenta para auxílio dos médicos em todo o mundo no manejo dos casos suspeitos de encefalite viral, o consórcio de 2013 propôs dois algoritmos, um para adultos e outro para crianças, mostrados abaixo [9].
Tabela 2. Algoritmo Diagnóstico para Avaliação Inicial de Encefalite em Adultos
EXAMES DE ROTINA | LCR | Coletar pelo menos 20 mL de líquido; congelar 5–10 mL, se possível |
LCR | Pressão de saída, contagem de leucócitos com diferencial, contagem de hemácias, proteína, glicose | |
LCR | Bacterioscopia com coloração por Gram e cultura para bactérias | |
LCR | PCR para HSV-1/2 (se disponíveis, considerar também IgM e IgG para HSV no LCR) | |
LCR | PCR para VZV (a sensibilidade pode ser baixa; se disponíveis, considerar também IgM e IgG para VZV no LCR) | |
LCR | PCR para enterovírus | |
LCR | Antígeno do criptococo e/ou coloração por tinta da China | |
LCR | Bandas oligoclonais e índice de IgG | |
LCR | VDRL | |
SORO | Hemoculturas de rotina | |
Sorologia para HIV (considerar RT-PCR) | ||
Testes para treponema (rapid plasma reagin — RPR, teste específico para treponema) | ||
Armazenar soro do estado agudo e coletar nova amostra no período de convalescência, 10–14 dias após, para exames de anticorpos pareados | ||
IMAGEM | Neuroimagem (se disponível, RNM é preferível à tomografia computadorizada — TC) | |
Imagem do tórax (raio-X e/ou TC) | ||
NEUROFISIOLOGIA | EEG | |
OUTROS TECIDOS / FLUIDOS | Quando houver envolvimento de órgãos/sistemas fora do SNC, recomendam-se exames adicionais (ex.: biópsia de lesões de pele; lavado broncoalveolar e/ou biópsia endobrônquica em indivíduos com pneumonia/lesões pulmonares; swab de garganta para PCR/cultura naqueles com doenças das vias aéreas superiores; cultura de fezes naqueles com diarreia); ver também abaixo | |
EXAMES EVENTUAIS | FATORES DO HOSPEDEIRO | Imunocomprometidos — PCR para CMV, HHV-6/7, HIV (LCR); sorologia e/ou PCR para Toxoplasma gondii; testes para Mycobacterium tuberculosis (TB); testes para fungos; testes para o vírus do Nilo Ocidental (West Nile virus — WNV) |
FATORES GEOGRÁFICOS | África — malária (esfregaço de sangue), tripanossomíase (sorologia e esfregaço de sangue/LCR), testes para dengue | |
FATORES GEOGRÁFICOS | Ásia — testes para vírus da encefalite japonesa; testes para dengue; malária (esfregaço de sangue); teste para o vírus Nipah (sorologia no sangue e LCR; PCR, imunoistoquímica e isolamento viral num laboratório com nível de biossegurança 4 também podem ser usados para substanciar o diagnóstico) | |
FATORES GEOGRÁFICOS | Austrália — testes para o vírus Murray Valley; testes para o vírus Kunjin; teste para o lyssavirus do morcego australiano | |
FATORES GEOGRÁFICOS | Europa — vírus da encefalite transmitida por carrapato (sorologia); se no sul da Europa, considerar WNV; testes para o vírus da Toscana | |
FATORES GEOGRÁFICOS | Américas Central e do Sul — testes para dengue; malária (esfregaço de sangue); testes para WNV e encefalite equina venezuelana | |
FATORES GEOGRÁFICOS | América do Norte — testes para arboviroses presentes em certas regiões geográficas (ex.: WNV, vírus Powassan, LaCrosse e da encefalite equina ocidental, doença de Lyme [ELISA e Western blot séricos]) | |
ESTAÇÃO DO ANO / EXPOSIÇÃO | Verão/Outono — testes para arbovírus e doenças do carrapato | |
ESTAÇÃO DO ANO EXPOSIÇÃO | Gatos (particularmente se paciente com convulsões e LCR paucicelular) — anticorpos para Bartonella henselae (soro), avaliação oftálmica | |
ESTAÇÃO DO ANO EXPOSIÇÃO | Exposição a carrapatos — testes para doenças do carrapato | |
ESTAÇÃO DO ANO EXPOSIÇÃO | Histórico de mordidas de animais/exposição a morcegos — testes para raiva | |
ESTAÇÃO DO ANO EXPOSIÇÃO | Nadar ou mergulhar em água doce morna ou lavagem nasal/sinusal — Naegleria fowleri (microscopia wet mount e PCR no LCR) | |
SINAIS E SINTOMAS ESPECÍFICOS | Padrões psicóticos ou transtornos do movimento — anticorpos anti-NMDAR (soro, LCR); testes para raiva; triagem para malignidades e doença de Creutzfeld-Jakob | |
Sintomas límbicos proeminentes — testes para encefalite límbica autoimune; PCR para HHV-6/7 (LCR); triagem para malignidades | ||
Descompensação rápida (particularmente se história de mordidas de animais ou viagens a áreas endêmicas para raiva) — testes para raiva | ||
Sintomas respiratórios — sorologia (soro) e PCR de swab na garganta para Mycoplasma pneumoniae (se um ou ambos positivos, então fazer PCR no LCR); testes para vírus respiratórios | ||
Paralisia flácida aguda — testes para arboviroses; testes para raiva | ||
Parkinsonismo — testes para arboviroses; sorologia para Toxoplasma sp | ||
Lesões de pele não cicatrizantes — testes para Balamuthia mandrilaris e Acanthamoeba spp | ||
PERFIS LABORATORIAIS | Transaminases elevadas — sorologia para Rickettsia spp, testes para doenças do carrapato | |
Proteína no LCR >100 mg/dL, ou glicose no LCR <2/3 da periférica, ou pleocitose linfocítica com início subagudo de sintomas — testes para TB, testes para fungos | ||
Proteína no LCR >100 mg/dL, ou glicose no LCR <2/3 da periférica e pleocitose neutrofílica com início agudo de sintomas e uso recente de antibióticos — PCR no LCR para Streptococcus pneumoniae e Neisseria meningitidis | ||
Eosinofilia no LCR — testes para TB; testes para fungos; sorologia para Baylisascaris procyonis (soro); teste para Angiostrongylus cantonensis e Gnathostoma sp | ||
Hemácias no LCR — testes para Naegleria fowleri | ||
Hiponatremia — anticorpos anti-canal de potássio dependente de voltagem (VGKC); testes para TB | ||
PERFIS DE NEUROIMAGEM | Lobo frontal — testes para Naegleria fowleri (microscopia wet mount e PCR no LCR) | |
Lobo temporal — anticorpos anti-VDKC (soro e LCR); PCR para HHV-6/7 (LCR) | ||
Gânglios da base e/ou tálamo — testes para arboviroses; testes para TB | ||
Tronco cerebral — testes para arboviroses; PCR para Listeria sp (se disponível); anticorpos anti-Brucella sp (soro); testes para TB | ||
Cerebelo — PCR (LCR) e sorologia para EBV | ||
Edema cerebral difuso — testes para vírus respiratórios | ||
Lesões ocupantes de espaço e/ou com captação anelar em meio de contraste — testes para TB; testes para fungos; testes para Balamuthia mandrilaris e Acanthamoeba spp; sorologia para Toxoplasma gondii | ||
Hidrocefalia e/ou captação meníngea basilar de contraste — testes para TB; testes para fungos | ||
Infarto ou hemorragia — testes para TB; testes para fungos; testes para vírus respiratórios |
Adaptado de Venkatesan A et al. Case Definitions, Diagnostic Algorithms, and Priorities in Encephalitis: Consensus Statement of the International Encephalitis Consortium. Clin Infect Dis. 2013
Exames diagnósticos
Tabela 3. Algoritmo Diagnóstico para Avaliação Inicial de Encefalite em Crianças
EXAMES DE ROTINA | LCR | Coletar pelo menos 5 mL de líquido; congelar o que não for utilizado para possíveis testes adicionais |
LCR | Pressão de saída, contagem de leucócitos com diferencial, contagem de hemácias, proteína, glicose | |
LCR | Bacterioscopia com coloração por Gram e cultura para bactérias | |
LCR | PCR para HSV-1/2 (se disponíveis, considerar também IgM e IgG para HSV no LCR) | |
LCR | PCR para VZV (a sensibilidade pode ser baixa; se disponíveis, considerar também IgM e IgG para VZV no LCR) | |
LCR | PCR para enterovírus | |
SORO | Hemoculturas de rotina | |
Sorologia para EBV (VCA IgG [contra o antígeno do capsídeo viral] e EBNA IgG [contra o antígeno nuclear do EBV]) | ||
IgM e IgG para Mycobacterium tuberculosis | ||
Armazenar soro do estado agudo e coletar nova amostra no período de convalescência, 10–14 dias após, para exames de anticorpos pareados | ||
IMAGEM | Neuroimagem (se disponível, RNM é preferível à tomografia computadorizada — TC) | |
NEUROFISIOLOGIA | EEG | |
OUTROS TECIDOS/ FLUÍDOS | PCR de swab na garganta para Mycoplasma pneumoniae | |
OUTROS TECIDOS/ FLUÍDOS | PCR e/ou cultura de swab da garganta e de fezes para enterovírus | |
OUTROS TECIDOS/ FLUÍDOS | Quando houver envolvimento de órgãos/sistemas fora do SNC, recomendam-se exames adicionais (ex.: biópsia de lesões de pele; lavado broncoalveolar e/ou biópsia endobrônquica em indivíduos com pneumonia/lesões pulmonares; swab de garganta para PCR/cultura naqueles com doenças das vias aéreas superiores; cultura de fezes naqueles com diarreia); ver também abaixo | |
EXAMES EVENTUAIS | FATORES DO HOSPEDEIRO | Idade <3 anos — PCR para parecovírus (LCR) |
EXAMES EVENTUAIS | FATORES DO HOSPEDEIRO | Imunocomprometidos — PCR para CMV, HHV-6/7, HIV (LCR); antígeno criptocócico; sorologia e/ou PCR para Toxoplasma gondii; testes para TB; testes para fungos; testes para vírus do Nilo Ocidental (West Nile virus — WNV) |
EXAMES EVENTUAIS | FATORES GEOGRÁFICOS | África — malária (esfregaço de sangue), tripanossomíase (sorologia e esfregaço de sangue/LCR), testes para dengue |
EXAMES EVENTUAIS | FATORES GEOGRÁFICOS | Ásia — testes para vírus da encefalite japonesa; testes para dengue; malária (esfregaço de sangue); teste para o vírus Nipah (sorologia no sangue e LCR; PCR, imunoistoquímica e isolamento viral num laboratório com nível de biossegurança 4 também podem ser usados para substanciar o diagnóstico) |
EXAMES EVENTUAIS | FATORES GEOGRÁFICOS | Austrália — testes para o vírus Murray Valley; testes para o vírus Kunjin; teste para o lyssavirus do morcego australiano |
EXAMES EVENTUAIS | FATORES GEOGRÁFICOS | Europa — vírus da encefalite transmitida por carrapato (sorologia); se no sul da Europa, considerar WNV; testes para o vírus da Toscana |
EXAMES EVENTUAIS | FATORES GEOGRÁFICOS | Américas Central e do Sul — testes para dengue; malária (esfregaço de sangue) |
EXAMES EVENTUAIS | FATORES GEOGRÁFICOS | América do Norte — testes para arboviroses presentes em certas regiões geográficas (ex.: WNV, vírus Powassan, LaCrosse e da encefalite equina ocidental, doença de Lyme [ELISA e Western blot séricos]) |
EXAMES EVENTUAIS | ESTAÇÃO DO ANO EXPOSIÇÃO | Verão/Outono — testes para arbovírus e doenças do carrapato |
EXAMES EVENTUAIS | ESTAÇÃO DO ANO EXPOSIÇÃO | Gatos (particularmente se paciente com convulsões e LCR paucicelular) — anticorpos para Bartonella henselae (soro), avaliação oftálmica |
EXAMES EVENTUAIS | ESTAÇÃO DO ANO EXPOSIÇÃO | Exposição a carrapatos — testes para doenças do carrapato |
EXAMES EVENTUAIS | ESTAÇÃO DO ANO EXPOSIÇÃO | Histórico de mordidas de animais/exposição a morcegos — testes para raiva |
EXAMES EVENTUAIS | ESTAÇÃO DO ANO EXPOSIÇÃO | Nadar ou mergulhar em água doce morna ou lavagem nasal/sinusal — Naegleria fowleri (microscopia wet mount e PCR no LCR) |
EXAMES EVENTUAIS | SINAIS E SINTOMAS ESPECÍFICOS | Comportamento anormal (ex.: crises de birra recém-iniciadas, agitação, agressão), padrões psicóticos, convulsões ou transtornos do movimento — anticorpos anti-NMDAR (soro, LCR), bandas oligoclonais, índice de IgG, testes para raiva |
EXAMES EVENTUAIS | SINAIS E SINTOMAS ESPECÍFICOS | Mudanças comportamentais seguidas de espasmos/abalos mioclônicos: IgG para sarampo (LCR e soro) |
EXAMES EVENTUAIS | SINAIS E SINTOMAS ESPECÍFICOS | Exantema vesicular — PCR para VZV no LCR (sensibilidade pode ser baixa; se disponível, considerar IgM e IgG no LCR); IgM e IgG séricas para VZV |
EXAMES EVENTUAIS | SINAIS E SINTOMAS ESPECÍFICOS | Descompensação rápida (particularmente se história de mordidas de animais ou viagens a áreas endêmicas para raiva) — testes para raiva |
EXAMES EVENTUAIS | SINAIS E SINTOMAS ESPECÍFICOS | Sintomas respiratórios — imagem do tórax (raio-X e/ou TC); testes para vírus respiratórios; sorologia (soro) e PCR (LCR) para Mycoplasma pneumoniae |
EXAMES EVENTUAIS | SINAIS E SINTOMAS ESPECÍFICOS | Paralisia flácida aguda — testes para arboviroses; testes para raiva |
EXAMES EVENTUAIS | SINAIS E SINTOMAS ESPECÍFICOS | Parkinsonismo — testes para arboviroses; sorologia para Toxoplasma gondii |
EXAMES EVENTUAIS | SINAIS E SINTOMAS ESPECÍFICOS | Lesões de pele não cicatrizantes — testes para Balamuthia mandrilari e Acanthamoeba spp |
EXAMES EVENTUAIS | SINAIS E SINTOMAS ESPECÍFICOS | Sintomas límbicos proeminentes — testes para encefalite límbica autoimune; PCR para HHV-6/7 (LCR) |
EXAMES EVENTUAIS | PERFIS LABORATORIAIS | Se a sorologia para EBV for sugestiva de infecção aguda, realizar PCR para EBV (LCR) |
EXAMES EVENTUAIS | PERFIS LABORATORIAIS | Transaminases elevadas — sorologia para Rickettsia spp, testes para doenças do carrapato |
EXAMES EVENTUAIS | PERFIS LABORATORIAIS | Proteína no LCR >100 mg/dL, ou glicose no LCR <2/3 da periférica, ou pleocitose linfocítica com início subagudo de sintomas — testes para TB, testes para fungos, testes para Balamuthia mandrilaris |
EXAMES EVENTUAIS | PERFIS LABORATORIAIS | Proteína no LCR >100 mg/dL, ou glicose no LCR <2/3 da periférica e pleocitose neutrofílica com início agudo de sintomas e uso recente de antibióticos — PCR no LCR para Streptococcus pneumoniae e Neisseria meningitidis |
EXAMES EVENTUAIS | PERFIS LABORATORIAIS | Eosinofilia no LCR — testes para TB; testes para fungos; sorologia para Baylisascaris procyonis (soro e LCR); teste para Angiostrongylus cantonensis e Gnathostoma sp |
EXAMES EVENTUAIS | PERFIS LABORATORIAIS | Hiponatremia — testes para TB |
EXAMES EVENTUAIS | PERFIS LABORATORIAIS | Sorologia ou PCR de swab de garganta positivos para Mycoplasma pneumoniae — PCR para Mycoplasma pneumoniae (LCR) |
EXAMES EVENTUAIS | PERFIS DE NEUROIMAGEM | Lobo frontal — testes para Naegleria fowleri (microscopia wet mount e PCR no LCR) |
EXAMES EVENTUAIS | PERFIS DE NEUROIMAGEM | Lobo temporal — PCR para HHV-6/7 (LCR) |
EXAMES EVENTUAIS | PERFIS DE NEUROIMAGEM | Gânglios da base e/ou tálamo — testes para vírus respiratórios; testes para arboviroses; testes para TB |
EXAMES EVENTUAIS | PERFIS DE NEUROIMAGEM | Tronco cerebral — testes para vírus respiratórios; testes para arboviroses; PCR para Listeria sp (se disponível); anticorpos anti-Brucella sp (soro); testes para TB |
EXAMES EVENTUAIS | PERFIS DE NEUROIMAGEM | Cerebelo — PCR para VZV no LCR (sensibilidade pode ser baixa; se disponível, considerar IgM e IgG no LCR); IgM e IgG para VZV sérica; PCR para EBV (LCR) |
EXAMES EVENTUAIS | PERFIS DE NEUROIMAGEM | Edema cerebral difuso — testes para vírus respiratórios |
EXAMES EVENTUAIS | PERFIS DE NEUROIMAGEM | Lesões ocupantes de espaço e/ou com captação anelar em meio de contraste — testes para TB; testes para fungos; testes para Balamuthia mandrilaris e Acanthamoeba spp; sorologia para Toxoplasma gondii |
EXAMES EVENTUAIS | PERFIS DE NEUROIMAGEM | Hidrocefalia e/ou captação meníngea basilar de contraste — testes para TB; testes para fungos; testes para Balamuthia mandrilaris |
EXAMES EVENTUAIS | PERFIS DE NEUROIMAGEM | Infarto ou hemorragia — testes para TB; testes para fungos; testes para vírus respiratórios |
EXAMES EVENTUAIS | PERFIS DE NEUROIMAGEM | Lesões na substância branca — bandas oligoclonais; índice de IgG; doença de Lyme (ELISA e Western blot no soro); Brucella sp (sorologia e cultura no LCR); testes para sarampo na panencefalite necrozante aguda; anticorpos anti-Baylisascaris procyonis (soro e LCR); testes para Balamuthia mandrillaris |
Adaptado de Venkatesan A et al. Case Definitions, Diagnostic Algorithms, and Priorities in Encephalitis: Consensus Statement of the International Encephalitis Consortium. Clin Infect Dis. 2013
O VÍRUS DO NILO OCIDENTAL NO BRASIL
Classicamente, o vírus do Nilo Ocidental (WNV) não constitui um patógeno potencial para encefalites no Brasil, devendo ser considerado apenas para aqueles pacientes que viajaram para regiões endêmicas. Em 2011, foram encontradas, pela primeira vez, evidências da circulação do vírus no Brasil. Na época, pesquisadores do IOC/Fiocruz identificaram anticorpos para o WNV no sangue de cavalos do Pantanal do Mato Grosso do Sul. Isso indica que, em algum momento, estes animais tiveram contato com o vírus. Apenas em 2014 foi detectado o primeiro caso clínico de febre do Nilo Ocidental em humanos no país, no estado do Piauí [10]. Em julho deste ano (2018), pesquisadores do Instituto Evandro Chagas, em Belém, anunciaram ter feito o primeiro isolamento em equinos em uma fazendo no Espírito Santo mortos por encefalite causada pelo vírus.
O WNV é da mesma família do zika, também originário da África e transmitido por mosquitos. Entrou nas Américas pelos Estados Unidos, no fim da década de 1990, dispersou-se rapidamente naquele país e migrou para as Américas Central e do Sul [11].
Os exames de rotina mais frequentemente empregados para o diagnóstico da encefalite viral incluem a reação de cadeia de polimerase (PCR) e PCR transcriptase-reversa (RT-PCR) em amostras de LCR. PCR é usado na detecção de vírus DNA, enquanto o RT-PCR é para os vírus RNA.
De forma mais resumida, uma recente revisão publicada no NEJM [3] propõe que testes iniciais em indivíduos imunocompetentes incluam ensaios de PCR e RT-PCR no LCR para HSV-1, HSV-2, VZV, enterovírus e, em crianças <3 anos, parecovírus humano. Caso esses exames falhem em determinar o agente causal, frequentemente parte-se para exames que incluem PCR no LCR para CMV, HHV-6/7, EBV e HIV — esses exames podem ser solicitados já inicialmente em pacientes imunossuprimidos. Testes sorológicos em amostras de soro e LCR são essenciais para a pesquisa de arboviroses, VZV, EBV, sarampo, caxumba, rubéola e raiva, dentre outros.
PCRs adicionais
PCR e RT-PCR em espécimes da garanta e nasofaringe podem ajudar a estabelecer um diagnóstico de infecções por adenovírus, influenza e sarampo, enquanto testes na saliva ajudam no diagnóstico de caxumba e raiva, e testes nas fezes no de infecções por enterovírus.
Essencialmente, os exames diagnósticos focam em distinguir duas situações: encefalite viral de autoimune e encefalite por HSV daquela causada por outros agentes virais. Não há diferenças significativas, no que diz respeito ao padrão clínico de apresentação, entre a encefalite por HSV e por não-HSV, mas, de maneira geral, o HSV cursa com pleocitose no LCR mais pronunciada e anormalidades focais mais frequentes no EEG e em exames de neuroimagem. Em uma revisão de casos de encefalites em adultos caracterizadas por anomalias nos lobos temporais em exames de ressonância nuclear magnética (RNM), os padrões que favoreceram o HSV foram idade mais avançada, apresentação clínica aguda, febre, sintomas gastrointestinais e baixas incidências de ataxia e exantema. Os não-HSV mais frequentemente tiveram lesões bitemporais, bem como lesões fora do lobo temporal e das regiões do giro cingulado e insular [3].
Testes de sequenciamento de nova geração para identificar patógenos no LCR ou tecido cerebral recentemente tornaram-se disponíveis comercialmente nos EUA. Neles, ácido nucleico do hospedeiro ou do patógeno são extraídos dessas amostras, purificados e sequenciados, sendo posteriormente comparados com uma base de dados em uma biblioteca para a identificação do patógeno. No entanto, estudos adicionais ainda são necessários para determinar sua sensibilidade e especificidade, seu impacto nos resultados e as situações nas quais eles poderiam substituir os testes convencionais [3].
NEUROIMAGEM
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